No olhar moderno, científico e racionalista, o ser humano é um mero acidente fortuito na longa vida do universo. Somos apenas um acontecimento insignificante e aleatório que emergiu no cosmos 13,7 bilhões de anos depois do Big-Bang. Neste olhar racional, somos absurdamente ínfimos diante da imensidão cósmica, somos o pó do pó, uma insignificância irrelevante num universo inimaginavelmente imenso e velho… Diante desta compreensão moderna do universo, revelada pela ciência, ficamos perplexos com a visão bíblica de que o homem foi criado “à imagem e semelhança” de Deus. Como um ser tão ridiculamente insignificante no contexto cósmico pode afirmar com tanta petulância que foi criado à imagem e semelhança de Deus?
A cosmogonia cristã, de fato, é radicalmente centrada na pessoa humana, na existência humana. Para o cristianismo, o ser humano está no centro do mundo, o universo todo foi criado para ele. No entanto, esta cosmogonia cristã não contradiz a visão científica, já que ela discorre sobre significados, não sobre fenômenos físicos e relações causais entre eventos materiais. A ciência investiga os fatos, procurando descobrir relações causais e leis invariantes que regem os fenômenos físicos, o mundo dos objetos sensíveis em sua existência no espaço-tempo. Mas o cristianismo, transcendendo a verdade empírica e científica, revela o sentido, o significado de tudo isso, o sentido do universo e da vida humana que nele está inserida.
Mas como o cristão pode ter tanta pretensão de saber e conhecer os significados últimos da existência humana e do universo? De onde vem esse saber?
Os cristãos acreditamos que Deus se revelou, se autocomunicou, se fez visível para o ser humano através do “evento” Jesus Cristo. Acreditamos que Jesus Cristo, apesar de ter sido uma pessoa humana, de natureza humana, possuía também uma natureza divina, era o “Filho de Deus” que veio “habitar” entre nós. Deus se revelou, se fez visível na face humana de Jesus Cristo. Acreditamos nisso não porque é um fato provado cientificamente, uma verdade demonstrada racionalmente, uma realidade verificada empiricamente. A autocomunicação de Deus no evento Jesus Cristo é um “mistério da fé”, mistério que ultrapassa a razão, mas que também a ilumina. Apenas a experiência pessoal desse mistério, a experiência do encontro pessoal com o Cristo no interior do coração e no amor ao próximo, somente esta experiência viva do mistério revelado em Cristo é que fundamenta e sustenta essa fé.
Assim, o evento Jesus Cristo, a “encarnação” humana de Deus, nos revela que – apesar de sermos insignificantes e irrelevantes na dimensão do espaço e do tempo – somos, na dimensão sobrenatural, no coração de Deus, na dimensão do Espírito, o centro do universo, o centro da criação. No Espírito do Cristo, somos adotados como filhos e herdeiros do Pai Celeste, somos destinados à vida gloriosa na eternidade. Nessa autocomunicação de Deus, compreendemos que o ser humano é o fim último da criação, que fomos criados para sermos também, como Jesus Cristo, “filhos” de Deus, co-participantes em sua glória, herdeiros da vida eterna.